quarta-feira, 6 de julho de 2011

"O jornalismo é universal, você tem que ser didático": Rodrigo Meneses, repórter do Massa!

Júlia Belas e Luiz Fernando Teixeira



Rodrigo Meneses é repórter do Massa!, e seus textos muitas vezes são aproveitados também pelo jornal A Tarde. Durante nossa entrevista, Rodrigo nos fala sobre a estrutura dos dois jornais, as suas diferentes metodologias e linhas editoriais, além de comentar algumas das matérias de sua autoria que foram publicadas durante o período de análise dos jornais.

Quando um repórter é contratado pelo Grupo A Tarde, ele é escolhido para um jornal já definido?
Como o Massa! é novo, tem oito meses, vai completar um ano dia 7 de outubro, eu e as pessoas que estão trabalhando no Massa fizemos uma seleção para trabalhar lá. Foram seis etapas. Mas você é contratado para trabalhar ou no Massa! ou no A Tarde. Abriram várias vagas no A Tarde, as pessoas são contratadas para trabalhar num veículo específico.

Como são escolhidos os repórteres que escreverão matérias para os dois jornais?
É um grupo de comunicação. No A Tarde tem o Massa!, tem o A Tarde, tem o A Tarde online, tem a Web TV. No Massa! e no A Tarde, como são impressos, as reuniões de pauta são entre editores dos dois jornais. Tem um secretário de redação para os dois jornais nas reuniões, e tem pautas que são do interesse dos dois jornais. Os materiais acabam sendo aproveitados.

Como é a estrutura das redações do Massa! e do A Tarde?
A equipe do Massa! é bem menor e o jornal A Tarde é aquele jornal tradicional. O Massa! tem uma equipe reduzida, tem uma editora-chefe e os editores de cada editoria: editoria Geral tem dois editores, um que pega a parte de Polícia e o outro com Economia Popular e Educação. Economia popular são vagas de emprego e outras coisas de economia que interessam mais o público do Massa!, classes C, D e E. E tem a página "Nas Ruas", que é matéria de bairro. Costuma ser a 7 [página], costuma ter matérias sobre bairros e ruas de Salvador. A editoria de Esportes tem um editor e um sub-editor também. Na editoria Bem viver são matérias de entretenimento, saúde, comportamento. Cada editoria tem dois editores. Esportes, dois repórteres, bem viver só tem uma repórter, geral tem três repórteres, geralmente dois em polícia e um na parte de economia popular. O repórter do Massa! acaba fazendo matéria não só de polícia, mas de tudo. Além das estagiárias.

O que essas redações dividem em termos estruturais, tipo equipamentos, carros, o próprio espaço...
O Massa! tem três carros, mas quando tem problema, por exemplo, quando já tem três repórteres do Massa! na rua e o carro do A Tarde tá aí parado, a gente pode pegar o carro do A Tarde. Porque o Massa! só é uma segmentação do produto, mas a estrutura é dividida, mas caso haja algum empecilho, você pode utilizar. A redação é no mesmo espaço, tem uma bancada de repórteres, diagramadores e editores que é do Massa!. Mas também às vezes, o repórter do Massa! tá na rua e não tem computador, o do A Tarde pode usar a máquina. Para a equipe do jornal ficar mais próxima, eles dividiram a redação e ficam os repórteres, editores e diagramadores do Massa! em uma bancada.

Qual a rotina pra você, que escreve tanto pro Massa! quanto para o A Tarde?
Depende dos horários. O A Tarde tem vários horários. O pessoal da manhã chega 8h, o turno da tarde entra 14h e quem fica no plantão chega às 17h. A carga horária é de 7h.

Vocês trabalham como uma dupla, com fotógrafo específico pra cada repórter, ou trabalham com aquele que estiver disponível?
O Massa! trabalha assim. Sempre é uma dupla, porque no Massa! são dois fotógrafos, um para o turno da manhã e outro para a tarde. No caso, eu, que pego pela manhã, sempre saio com aquele fotógrafo, e o repórter que sai de tarde sempre sai com aquele mesmo fotógrafo também. No A Tarde é mais difícil você trabalhar sempre com aquele mesmo fotógrafo, é o que estiver disponível na hora.

Quando você recebe uma pauta, já sabe que será para um dos ou para os dois jornais?
Não é sempre que a gente sabe. Isso vai depender do resultado que vem da própria pauta mesmo. Tem uma matéria que foi publicada hoje (29/06) sobre uma capitã da PM que foi escolhida para ser a comandante da base de segurança comunitária que vai ser instalada no Calabar. Eu pego a entrevista que foi publicada no jornal de ontem (28/06), em que o coronel da PM falou: “-Fiz um convite à capitã Roseane para ser a comandante da base de segurança do Nordeste, que será instalada”. Então eu aproveito essa pauta de ontem para entrevistar essa pessoa e saber que material será apresentado para o A Tarde também, mas nem sempre você sabe. Eu mesmo, que trabalho em Polícia...tem coisa que acontece no dia-a-dia da cidade que se for do interesse do A Tarde eles publicam também.

O Massa! é um jornal que não sai aos domingos. Qual o procedimento com os acontecimentos que surgem no sábado?
O Massa! não sai dia no domingo, segundo o que nosso editor falou, porque tradicionalmente os jornais populares não saem dia de domingo, e também para não competir com o A Tarde, já que há aquela tradição de comprar o A Tarde no domingo, tem gente que só compra no domingo, e por isso o Massa! não circula nesse dia, para que não haja essa competição, e as pessoas que compram o Massa! comprarem o A Tarde dia de domingo. Segundo o que eles passaram pra gente, o pessoal que está lendo o Massa! pode ser uma classe que está em ascensão, que está lendo o Massa! mas que pode entrar pra uma faculdade, ascender pra uma nova classe econômica, e possa virar um leitor do A Tarde depois. É uma questão de estratégia para esse público que não lê jornal e poderá passar a ler o A Tarde também.

Com relação às matérias sobre Nem Gorda, foram vários dias quase sequenciados tratando desse assunto; não seria mais fácil manter uma pessoa responsável por acompanhar o caso ao invés de repórteres diferentes?
Eu fiz uma matéria do dia em que ela foi presa, porque foi dia de domingo e eu estava trabalhando aqui. Aí na segunda já foi meu colega João Eça que foi fazer, e ele foi dar continuidade, e depois dessa matéria na segunda-feira, ele foi fazer todas as matérias sobre Nem Gorda. Ele até conheceu o advogado dela, estreitou os laços para ter mais acesso às informações.

As matérias “Investigador é sepultado sob clima de consternação” do A Tarde e “Presos 3 acusados de matar policial” do Massa!, ambas do dia 02/06, começam com o mesmo lead, mas a abordagem é diferente. Por que houve essa distinção?
Às vezes o Massa! brinca mais nos títulos, manchetes, é uma orientação pra gente, porque o jornalismo é universal, você tem que ser didático, falar numa linguagem simples, para todo o público entender. Aí no Massa!, há aquele caráter de novela, que permite você brincar mais na narrativa, e no A Tarde você tem liberdade de criação também, mas é um jornal mais sério, aí você acaba escrevendo até um texto meio careta, mas há uma certa liberdade criativa. A depender, existem certos termos você não vai usar.

Ainda nessas matérias as fotos utilizadas são diferentes. Qual o critério de escolha?
Geralmente é acertado entre os editores não usar a mesma foto. Até a própria abordagem do Massa! vai pela questão mais emotiva, mais humana. Tenta pegar a questão da emoção, da história das pessoas. Isso também é um critério de definição. Também não se usa muito foto subjetiva. A foto não precisa descrever o texto, pode ser mais subjetiva pra provocar uma interpretação a mais do leitor. No Massa! geralmente se usa foto mais direta, que já esteja explícito o sentido naquela foto.

Há alguma dificuldade em fazer uma matéria que seja uma seqüência de outra escrita por outro repórter?
Tem dificuldade quando não há comunicação entre os repórteres. Mas quando a gente se comunica, troca os telefones, passa os contatos... O melhor seria se a pessoa continuasse, mas você vai quebrar esse grau de dificuldade conversando com o colega, um passando o que apurou para o outro.

As matérias “Mulher induz filho a fazer disparos contra o marido” e “Mãe põe pilha e filho atira no pai”, do dia 07/06, têm praticamente o mesmo texto, mas no Massa! ela recebe maior tamanho e destaque. Por quê?
É que o A Tarde, inclusive é uma queixa nossa, é um jornal onde há várias matérias já planejadas, matérias que não são do dia. Essas matérias acabam preenchendo o espaço da edição. E também vai pelo entendimento do editor do A Tarde mesmo, às vezes um fato que é uma matéria no Massa! ele dá uma coordenada, uma notinha, uma curta no A Tarde. O Massa! tem dois altos nas páginas 4 e 5, duas matérias principais de polícia e várias curtas. Aí é a aposta da gente, pelo tema, um filho atirar contra o pai. Aí o Massa! explora mais, tem mais espaço. Às vezes, o A Tarde dá duas páginas de segurança, uma página de segurança inteira, e acaba tendo mais espaço do que aquelas duas páginas do Massa!.

As matérias “Militares treinam ação de salvamento com apoio aéreo” e “Homem ao mar! Operação resgate”, ambas do dia 09/06, apresentam o mesmo texto. Mas por que o intertítulo “Capacitação” (A Tarde) ou “Parceria” (Massa!) é um texto no primeiro e no segundo aparece na forma de box?
Muitas vezes eu faço a matéria aqui, no Massa!, e vou embora. Eu nem sei se a matéria vai ser aproveitada pelo A Tarde, não é toda vez que você sabe. Tem vezes que o A Tarde pega meu texto e preenche o espaço. No Massa!, as matérias são mais divididas, enquanto no A Tarde o texto é corrido. Algumas vezes o A Tarde tem mais espaço, aí perguntam “você tem mais alguma informação?”, dão mais espaço pra eu contar essa história melhor, aí eu preencho e o texto fica mais diferente.

Nessa mesma matéria, o último parágrafo da parte “Parceria” é uma declaração. Já no Massa! ele ganha um destaque maior, aparecendo em uma nota e com o título “Ligados na Copa 2014”. Por quê?
No Massa! nunca é uma matéria só, sempre tem uma coordenadinha. A gente divide. Quando tem uma parte da matéria sobre determinado assunto, eu coloco nessa coordenada, enquanto no A Tarde ela pode vir toda no texto corrido, por causa do modelo editorial do jornal.

Sobre as matérias “Enterro de motorista vira ação de protesto” (A Tarde) e “Protesto pela morte de um trabalhador” (Massa!), do dia 10/06. A primeira foi escrita por você e por Paula Pitta, além da colaboração de Juliana Dias. Por que o nome de Juliana não foi colocado na parte onde normalmente vêm as assinaturas?
Quando vem como “colaborou” é porque ela fez uma parte pequena, pouca coisa. Quando se assina a matéria junto, é porque as duas pessoas apuraram bastante. “Colaborou” é quando você está na redação e precisa que alguma pessoa fale com alguém, pegue uma declaração, questione isso a essa pessoa. Vai pelo que você produziu daquela matéria. Se ela tivesse produzido tanto quanto eu e a outra repórter, aí o nome dela viria em cima também.

Pelo fato de o domingo ser um dia no qual geralmente ocorrem menos acontecimentos, os jornais de segunda-feira têm uma tendência a trazer matérias com caráter de reportagem, como no Massa! do dia 13/06, cuja página 3 era a matéria “Carteiros em estado de nervos”. Essas reportagens são pré-selecionadas para o dia ou ficam reservadas?
A gente planeja esses assuntos que não são quentes, factuais. Como no domingo trabalhamos com a equipe reduzida, a gente tem que sempre fazer uma matéria que é chamada “de gaveta” na edição de segunda-feira. A gente tem que fazer essa matéria durante a semana, preparar a reportagem durante a semana, porque com a equipe reduzida você não vai ter condições de fazer o jornal inteiro.
A matéria sobre o enterro do ex-vocalista Germano, do Olodum (“Despedida ao som dos tambores” no Massa! e “Tambores soam no adeus ao vocalista do Olodum” no A Tarde), tem maior destaque no Massa!, ocupando toda a página 3, enquanto no A Tarde ela recebe menor atenção. Por quê?
O Massa! tem a página 3 que são as notícias do dia, que são aquelas notícias que fazem a diferença, ou sobre pessoas que fazem a diferença, histórias assim, estilo reportagem, alguma coisa forte do dia... A página 3 do Massa! é a que tem mais espaço. No A Tarde, deram uma foto grande na capa, mas o espaço não foi tão grande. Isso é coisa pro editor do A Tarde responder. O que ele teve no dia, não deu tanta importância, achou que não deveria ter aquele espaço que veio no Massa!. O Massa! deu aquele espaço porque eu tenho mais contato com o pessoal de lá, e eu vendi a idéia dizendo que o enterro encheu, as pessoas choraram... Eu nunca tinha visto uma coisa daquelas. As pessoas cantaram durante o velório, o enterro tava marcado pras 11h e só aconteceu às 11h40, porque o pessoal ficou cantando as músicas que o cara compôs, pararam para rezar a missa e depois continuaram cantando em homenagem a ele. Era muita gente, e o cara foi um cantor importante do Olodum, que é um bloco afro popular, aí eu vendi a idéia. No A Tarde eu não fiz isso, como eu não tenho essa relação muito próxima com o editor.

Ainda sobre o enterro de Germano, como abordar as pessoas que estão lá, chorando a morte de algum ente querido, para conseguir uma entrevista?
É difícil. Você tem que saber chegar, ter a sensibilidade, cumprimentar as pessoas, se apresentar... A pessoa que está chorando muito não dá pra falar. Por isso que é bom chegar antes, que o momento de mais emoção é quando vão depositar o caixão, daí você conversa antes, que as pessoas estão mais serenas. Às vezes, tem aquele parente que se emociona mais, você não consegue falar, ou então vai esperar um momento que ele esteja mais calmo para poder falar. As pessoas compreendem que é o seu trabalho, mas tem gente que não entende... A mulher daquele motorista mesmo estava falando normal, mas o pessoal ficava dizendo “se você não quiser falar não fale, é tudo um bando de carniceiros”, como se a gente quisesse explorar a miséria da pessoa, a dor da pessoa. O leitor, quando pega o jornal um dia, quer ler uma declaração póstuma, ou se teve uma convivência próxima com a pessoa que morreu, gosta de ler. Quando você vai abordar uma pessoa pra entrevistar, você não obriga ela a falar. Você se apresenta, pergunta se ela pode te responder, se ela não quiser você não vai forçar a barra. Eu mesmo chego educadamente, espero um momento oportuno pra chegar, me apresento, pergunto se poderia conversar um pouco... Se a pessoa concordar a gente conversa. Se não quiser, eu não vou forçar a barra nesse momento de dor, num cemitério. Agora, tem outras situações que você tem que insistir mesmo, mas cemitério... Se a declaração da pessoa tá ali, foi porque ela quis.

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