quarta-feira, 30 de novembro de 2011

“Mas realmente as pessoas gostam de ver sangue, de ver crime. A gente escreve sobre o que a gente acha que as pessoas vão ler mais” | Priscilna Chammas

Jessica Lemos, Cláudio Jansen e Raquel Muniz




Priscila Chammas, 27 anos, é formada em Produção Cultural e Jornalismo pela Universidade Federal da Bahia desde 2009. Trabalhou como assessora de imprensa e há um ano e meio é repórter da editoria Mais! do Correio*. Em entrevista, ela contou um pouco sobre seu trabalho no jornal, a rotina produtiva, critérios de noticiabilidade, linha editorial do veículo e a sua visão sobre o público o qual ela escreve.

Como é a sua rotina produtiva como repórter no Correio?
A gente chega aqui recebe uma, duas, três, cinco, 10 pautas e ou vai para a rua, ou vai por telefone. A gente não segue uma rotina. Cada dia acontece uma coisa diferente. Às vezes, você vai cobrir um homicídio, outra vez, você vai cobrir uma aula de uma escola, assim coisas totalmente diferentes, é totalmente imprevisível a rotina do jornalista.

Quais os critérios que vocês usam para selecionar o que será ou não notícia?
Eu não sei de todos. Então, eu não sou a melhor pessoa para falar isso, mas normalmente são coisas que não são muito comuns de acontecer, por exemplo, se fala muito que uma morte na favela não é tão noticiada como a morte na Graça, num bairro nobre. Não é porque pobre pode morrer e rico não pode, é porque não é normal. Um assassinato, na Graça, não é uma coisa normal, mas um assassinato, na favela, é uma coisa que acontece todo dia. Não é que seja menos importante, mas é mais raro de acontecer (assassinato em bairros nobres), por isso que vira notícia. Coisas mais próximas da gente, também, coisas que acontecem em Salvador, a gente noticia mais que coisas que acontecem no interior que fica a 800 km daqui. Bom, eu confesso que não me lembro todos os critérios, mas basicamente é isso. E coisas relevantes, graves mesmo como um cara que matou 35 (pessoas), esse cara que cobri hoje (25 de novembro de 2011) mesmo. É isso.

Qual a linha editorial do Correio?
Bom. Muitas páginas de esporte. O pessoal gosta muito de ler sobre esporte e crime também. O pessoal, eu não acreditava até quando vim trabalhar aqui, mas realmente as pessoas gostam de ver sangue, de ver crime. A gente escreve mais sobre o que a gente acha que as pessoas vão ler mais. Política mesmo, eu vim aqui para cobrir as eleições, mas não existe uma editoria de política, porque o leitor do Correio* não lê muito sobre política. A gente só cobre quando acontece algum evento, alguma coisa fora da rotina. O dia a dia político a gente não cobre. Economia não é uma coisa mais de serviço. Aumento de professores é a economia que a gente dá, pois é uma coisa mais prática da vida do nosso leitor, por exemplo.

Então, vocês priorizam o interesse do público ao invés do interesse público?
Isso todo veículo comercial tem que priorizar. O interesse do público. Os interesses, às vezes, se confundem um com o outro, não é? Por exemplo, uma denúncia de corrupção. É de interesse do público, mas também é de interesse público.

Então, vocês do Correio acreditam que Violência e Esportes são as prioridades para o público do Correio*?
É o que o leitor gosta. A gente tem que escrever o que o leitor quer ler. Não adianta a gente escrever sobre uma coisa que a gente ache que é de interesse público. Se a pessoa não vai ler, não vai ser interesse público porque ninguém vai ler, não vai ter nenhuma repercussão. A gente tem que escrever o que a pessoa quer ler, não tem jeito (risos).

Qual o público-alvo do correio?
O Correio* já é o mais lido por todas as classes sociais, por todas as idades, por todos os dias da semana. Então, a gente não tem mais público alvo. O público alvo é todo mundo. Então, a gente tem que ir pelo “Homer Simpson, se você quiser ler o artigo de William Bonner, Homer Simpson é um homem médio, o que a gente tem que tirar uma média nem muito pra baixo, nem muito pra cima, uma média que todo mundo entenda, que todo mundo consiga acompanhar.

O Jornal Correio passou por uma reformulação, como se deu essa mudança?
Com essa mudança, a gente tinha, eu não sei o número exato, mas tínhamos uma tiragem de 15 mil exemplares, era bem baixo. A gente estava quase empatado com o Tribuna, que é o terceiro. E depois que teve a mudança, disparou na frente, está quase o dobro do A Tarde, hoje. Assim, o dobro eu não sei, mas está com 47 mil, com tiragem de quase 50 mil, está bem alto. Assim, agora é um jornal mais fácil de manusear, é menorzinho, tem mais figuras, é colorido, é uma leitura mais agradável, ler textos menores. Eu não fiz parte dessa reformulação. Quando cheguei, já estava reformulado. Então, não acompanhei, mas eu, como leitora, eu não lia o Correio* antes. E, quando mudou, eu passei a preferir ler o Correio* do que qualquer outro jornal, mesmo antes de trabalhar aqui, porque é uma leitura muito agradável, mais dinâmica, até de segurar o jornal; o A Tarde, você segura, cai todos os cadernos para um lado, para o outro (risos). O Correio você consegue ler no ônibus.

Como você lida com a pressão do jornalismo diário? Nesse sentido as relevâncias dos critérios mudam para construção da notícia, como ao fazer uma entrevista no local do acontecimento?
Você tem que ouvir todos os lados. Nem que seja para uma das pessoas falarem “Não quero dizer nada”, mas a gente tem que ouvir. Se a notícia envolve 30 pessoas – 30 pessoas não vou exagerar – mas, às vezes, a notícia envolve Polícia Militar, Polícia Civil, Secretaria de Segurança Pública. Tem que ouvir todo mundo, mesmo que a pessoa tente para a gente colocar no jornal “A reportagem tentou, mas não conseguiu falar com fulano”, a gente tem que tentar ouvir. Isso é obrigatório. Não importa se vai fechar o jornal, não importa a pressão, a gente tem que ouvir todo mundo. E assim, é complicado, porque, às vezes, nenhum jornalista aqui, pelo menos do Correio*, não sei os outros, ninguém cobre uma matéria só, por dia. No mínimo, duas, três. Então, a pressão é muito grande, é uma rotina bem... Você (Jessica Lemos) viu, não é? Que eu marquei com você às 16 h, não consegui, e aí achei que ia chegar às 19 h, de repente, mudou tudo, é bem louco, mas é muito bom também. Eu gosto bastante. Não me vejo fazendo outra coisa.

Teve alguma matéria que você gostou muito de fazer e acabou caindo, por questões políticas, por exemplo?
Para a matéria cair é um instante. Políticas... Questões políticas não me lembro. Pode acontecer, sim. Geralmente a entrevista que a gente mais gosta de fazer, que a gente está se empolgando, acaba caindo (risos). Teve uma, foi até uma época que uma babá sequestrou uma menina. Mandaram eu fazer uma matéria sobre babá, dicas para as mães, aí acha uma babá boa, uma babá má, resenha, conversa e tal. Eu estava amando fazer a matéria. Consegui fontes, consegui foto de criancinha bonitinha. Eu estava finalizando a matéria, o editor virou para mim e falou: - “Olha, esqueça. Caiu sua matéria, porque teve um evento lá não sei onde e vai entrar no lugar.” Poxa, fiquei p da vida (risos). Acho que essa foi a mais marcante, mas isso acontece direto. Às vezes, acontece pior. Você recebe cinco matérias, cinco pautas. Aí, você vai pela ordem que você acha que vai ser mais importante. Aí, por último, fica aquela “umazinha”. Aquela “umazinha” vai ser uma matéria grande e aí, no final de tudo, você tem que se virar para conseguir as informações, para crescer a matéria. Às vezes, você não tem nada e é louco, bem louco.

Como você vê a concorrência entre os jornais baianos? O Correio* e o Massa! por exemplo que custam o mesmo preço.
O Grupo A TARDE tem dois jornais: o A TARDE, o jornal para a classe A-B, o pessoal que estudou mais, que gosta de ler e tal, mais elitizado. E tem o Massa!, que eu acho muito ‘trash’. Eu acho horrível aquele jornal (risos), particularmente, nunca leria aquele jornal. Acho ele feio, acho mal diagramado, acho ele horroroso (risos), enfim, que é para a classe mais povão. Eu acho que o Correio* concorre com os dois, não é concorrente nem só do Massa!, nem só do A TARDE. O Correio*, pelo menos, busca atingir os dois públicos, tanto o povão do Massa!, quanto a elite do A TARDE. E está conseguindo, porque está ganhando. Tem mais de um ano que a gente bate o A TARDE. O Massa! acho que nem está nos índices ainda, porque é novo e tal e é experimental. Não sei como estão os índices dele. Ele é preto e branco, dentro, assim, pelo menos nas edições. Ele é feio de ler, ele não dá vontade de ler. Às vezes, a gente está cobrindo alguma coisa, porque o fotógrafo do A TARDE é o mesmo do Massa!, e aí tem lá um homicídio, um cara no chão sangrando. Aí, tipo, o fotógrafo do Correio* nem tira, porque isso não vai no jornal. Aí, o A TARDE tira, tal. Para o A TARDE, não vai não, mas para o Massa vai essa foto, porque o que é ‘trash’ o Massa dá. Enfim, acho que o Correio* concorrendo bem mais assim. As pessoas podem gostar do A TARDE, podem gostar do Correio*. Se ela não gostar de nenhum dos dois, ela fica com o Massa! Acho que qualquer um ajuda. Acho que tudo é válido. É uma outra forma de jornalismo. Quem sou eu para julgar?

É por causa desses dois públicos que o Correio* busca atingir que ele faz duas capas, uma para o assinante e outra para as bancas?
Não, na verdade, assim. Eu acho que, essa é minha opinião, não sei como é que funciona, mas eu acho que a capa da venda avulsa tem que ser mais impactante, até porque a pessoa tem que ver e se interessar para comprar. O assinante não. Vai chegar na casa dele, qualquer capa que estiver, ele não vai poder escolher, ele vai ler do mesmo jeito. Acho que por isso que tem capas diferentes. Não sei. Sinceramente, nunca perguntei, nunca tive essa curiosidade de perguntar por que tem duas capas, mas é que assim, muitas vezes, as capas são muito parecidas. Raras as vezes que são diferentes, totalmente diferentes. Acho que é por isso, porque a capa de venda avulsa precisa atrair mais a atenção.

Nenhum comentário:

Postar um comentário