quarta-feira, 30 de novembro de 2011

"A gente tem um trabalho bacana de política porque a gente está em cima da notícia todos os dias" Osvaldo Lyra

Gabriel Rodrigues, Lucas Amado, Mario Rafael Pinho


Osvaldo Lyra é editor de Política do jornal Tribuna da Bahia, além de assessor de comunicação da Câmera de Vereadores de Salvador. Formado há oito anos, atua há 10 na profissão. Passou pela prefeitura, governo, assembléia legislativa e outros jornais baianos.



Como funciona o processo de produção da notícia em uma editoria de política?
O processo de criação da notícia é um processo amplo, na verdade, a notícia está aí; muitas vezes nos bastidores, ela não está tão visível assim, por isso é importante o papel do jornalista e a capacidade dele de investigar, de acompanhar, de estar bem relacionado com as fontes. Por isso que, diferente de outras editorias, onde o repórter não tem o rigor de ter um acompanhamento, na editoria de política a gente tem muito a necessidade de ter um repórter setorista, justamente por ele estar em um trabalho de continuidade. Muitas coisas que acontecem nos bastidores da política, em uma câmera de vereadores, na assembléia legislativa, enfim, nos meios políticos como um todo, pra uma fonte, pra um político desses se sentir confortável e ter a confiança para falar muita coisa em off, que o que gera muitas das pautas, tem que ter uma relação da pessoa conhecer, saber quem é o profissional, qual o seu trabalho, etc.

Quais os segredos de um repórter de política para conquistar suas fontes?
Esse trabalho de construção entre fonte e repórter é feito no dia a dia, e muitas pautas surgem dessa relação que o repórter tem com o entrevistado, no caso um político. É assim que ele sabe o que acontece nos meios políticos, coisas que acontecem no poder que não estão explicitas, não são públicas como a gente fala.

Qual o público alvo do jornal Tribuna da Bahia?
Um público formador de opinião. Políticos, pessoas que trabalham no meio público, é um público muito selecionado. O Tribuna não tem o forte de ser vendido nas ruas, ser vendido em bancas de jornal, mas um público de assinantes. O Tribuna hoje tem uma faixa de 14 a 15 mil assinantes. É um público altamente selecionado, a gente não tem como competir com o Correio ou com o A Tarde, por isso a gente foco no público voltado para política. A política é o carro chefe do Jornal. É um jornal voltado para todos os públicos, mas o público que mais acessa é o A/B, que é um público que faz assinatura, que tem relação com os meios públicos, mas não é um jornal só para o público A/B é para todos os públicos.

Qual o principal concorrente do Tribuna hoje? 
Salvador tem três jornais de publicação diário em Salvador: A Tarde, Correio e Tribuna. O Correio conseguiu passar a liderança do A Tarde, do trabalho belíssimo do A Tarde, que passa por problemas estruturais, está em segundo lugar. Acho que não tem muito essa competição de quem está na frente, de quem compete com quem. A gente tem um trabalho bacana de política porque a gente está em cima da notícia todos os dias. O Correio montou uma estratégia, e com a morte de ACM eles retiraram o peso da editoria de política, justamente para tirar o ranço que existia no jornal. Tudo no Jornal remetia a ACM. Hoje a política no Correio se resume a coluna de Emerson José. O Jornal A Tarde não acompanha a política estadual, ele acompanha a política nacional, o que acontece em Brasília, material de agências. Aqui no Tribuna a gente tem conseguido pautar a política, acompanhar o que está ocorrendo nos bastidores, o que está por trás dos fatos da política de Salvador, da política da Bahia, e isso repercute nos próprios políticos e na relação com o jornal, isso fortalece e solidifica cada vez mais.

Como é a rotina produtiva do Tribuna da Bahia?
Pesada (risos). A gente começa a trabalhar desde cedo. Logo pela manhã a gente se fala para definir o que nós temos, o que tem de prioridade para cobrir, o que está acontecendo na política, para pautar. Passamos as pautas para o repórter e eles vão cobrir, apurar, logo depois eles escrevem e estão escrevendo neste momento e na política esse horário é o horário em que as coisas acontecem, mudam de rumo. A produção da notícia começa com os repórteres e depois nós temos reunião do fechamento com o editor e o chefe do jornal e, a partir daí, a gente começa o processo de edição, de revisão, e todo processo desde a elaboração de pauta até a edição final a gente acompanha.

Sobre a matéria “Agora quem manda é João”, publicada na edição do dia 18/11/11, do Tribuna da Bahia, por que entre todos os jornais baianos, só a Tribuna tocou neste assunto?
Por causa dessa política que a gente tem de estar sempre em cima da notícia. No dia em que a deputada Maria Luíza fez as declarações em plenário, a gente teve uma reunião aqui, na hora do fechamento e o diretor sugeriu que tivessem duas notas na coluna, já que se tratava da vida pessoal dela e isso não caberia mais do que aquele espaço. Nós [ele e Fernanda Chagas, subeditora de política da Tribuna] argumentamos, por mais que fosse a vida pessoal da deputada e do prefeito, ela usou o parlamento do Estado para lavar roupa suja, deu vexame. No dia seguinte então a gente tentou usar o que tinha de efeito de causa, além daquele discurso que ela deu. Nós demos em janeiro uma matéria, aqui na Tribuna, falando que o problema da prefeitura não era João, que o problema era Maria, e onde a gente costurava todo um contexto do que acontecia na prefeitura, as referências a deputada Maria Luíza, de demitir, de contratar, de azucrinar a cabeça do prefeito. Enfim, então a gente teve essa preocupação de mostrar esse fato que teve uma repercussão enorme, e agora a gente pegou esse gancho do discurso dela para falar que agora quem manda é João, e que tem agora a possibilidade de dar as cartas na prefeitura sem a interferência da mulher, porque antes ele dava as cartas, mas ela pintava e bordava.

A luta pelo mercado pode influenciar uma mudança de editorial? 
É como eu acabei de citar o exemplo do Correio. O Correio, por uma questão de política, mudou radicalmente; eles mudaram a imagem do jornal. E eles mudaram, praticamente excluíram a política do jornal. Eu posso falar disso, pois era repórter do Correio quando ACM era vivo. Voltei depois da sua morte e participei desse processo que aconteceu justamente em função do mercado. Eles queriam alcançar a liderança de mercado e sentiram que para isso precisavam tirar isso, porque o pior problema do correio era a política. E tiraram um peso. Então isso pode acontecer sim, a depender do que se queira, a depender do que se determina de linha editorial do jornal. Só para citar um exemplo que o senador Francisco Dornelles me deu há uns oito anos atrás, ele disse uma vez que existem sempre três versões para um fato: a minha versão, a sua e a versão correta. Qualquer notícia tem a versão e a visão que você quer dar a ela. Existe muito a questão da linha editorial, cada jornal tem a sua linha editorial, e a linha editorial do Tribuna é de uma política ‘light’. O Tribuna não tem a política de bater. Você não vê a Tribuna só batendo, como acontece em muitos Jornais, a gente fala coisas ruins, cobra, mas fala também dos pontos positivos, damos o outro lado dos bastidores.

Como o Tribuna está agindo diante das mudanças nos jornais baianos?
Esses novos formatos não causaram nenhum impacto. A principal mudança do impresso na Bahia pra mim é o Correio, que é um marco, pois mudou a história de se contar a notícia. Agora são histórias contadas no dia a dia, como uma revista diária. Deixou uma forma muito mais interessante de escrever, o que atrai o leitor e isso é bacana. Já o Tribuna não sofre nenhum impacto com isso, a gente tem é a preocupação de dar a notícia com qualidade.

Quanto à questão das mudanças na comunicação na Internet, nas redes sociais?
Acho que o Tribuna tem muito que avançar ainda nesse sentido. Ainda é muito pouco para a capacidade de abrangência que a gente pode alcançar. E o Tribuna está bem atrás nesse quesito. O nosso on-line, por exemplo, acho que pode melhorar muito. Vocês vão chegar no mercado de trabalho e vão perceber que a coisa é muito mais difícil do que parece... (risos).

Como acontece o acesso aos acontecimentos? Quais recursos estão disponíveis à reportagem? 
Por mais dificuldade que o Tribuna passe ou tenha passado, a gente consegue chegar hoje a qualquer lugar, conseguimos cobrir qualquer pauta, conseguimos deslocar a equipe para qualquer acontecimento. Temos carros, repórteres, fotógrafos, não temos esse tipo de problema não.

Porque a Tribuna não sai aos domingos? 
De forma bem leiga, eu acho que é porque como Tribuna trabalha muito com política e a política não funciona em feriados e finais de semana, não há a necessidade dessas edições.

E como fazer para cobrir um acontecimento no sábado?
Quando o assunto é importante a gente acaba deslocando um repórter, faz uma negociação por uma folga ou recupera o assunto no domingo. Articula com acessórias, “olhe mande fotos para mim”, e tenta pegar os contatos, porque em política tudo é feito nos bastidores, tudo acontece nas entrelinhas. Tem aí Internet, celular, telefone, tudo feito nas relações. Em política você não vai para a rua atrás de notícia, a noticia te acha onde você estiver; diferente do caderno cidades que você tem que ir, tem que ver, tem que acompanhar.

Qual a sua concepção sobre valor notícia?
Falando de jornal, é tudo que interessa a população e que deve ser público e tornar público, porque a nossa função não é "passar a mão na cabeça", é analisar, acompanhar, é saber, divulgar e dar visibilidade as coisas que acontecem.

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