quarta-feira, 27 de junho de 2012

"Contar histórias. A viagem desse jornal é essa" | Rafael Rodrigues

por Larissa Iten, Naiana Ribeiro e Raquel Muniz



Rafael Rodrigues é repórter de Cidades do Jornal Correio* desde dezembro de 2011. Apesar de jovem, o jornalista, formado pela Faculdade de Comunicação da UFBA (Facom/UFBA) na metade do ano passado, já teve experiências como repórter de Política e Cidades, dentre outras áreas.

Desde que começou a trabalhar, em Junho de 2007, ele já estagiou nos jornais Metrópole, Tribuna da Bahia e no Bahia Notícia. Além disso, já foi Assessor na Câmera Municipal de Salvador, onde permaneceu por 2 anos, ao mesmo tempo em que prestava serviços para o site www.politicalivre.com.br. 

Rafael nos contou que terá que voltar para a editoria de Política, a qual já trabalhou por algum tempo, para cobrir as eleições 2012.

Como é a sua rotina aqui no jornal Correio*?
Nós temos um horário fixo; normalmente há uma programação para cada repórter. Apesar disso, essa escala de horários varia muito com a nossa pauta. Muitas vezes os editores precisam dos repórteres para cobrir alguma coisa, em especial, ou quando há algum evento, por exemplo. Quando a gente chega geralmente já temos uma pauta definida; existe uma reunião de pauta semanal em que somos obrigados a dar uma sugestão de pauta, que são as matérias mais “frias”, “de gaveta”, são matérias mais analíticas, elaboradas, que são feitas para sair, normalmente, no sábado ou no domingo, quando há plantão.
As matérias de fim de semana e feriado são de gaveta, mais analíticas, com pautas mais trabalhadas. Em geral, as pautas do dia são mais factuais, mas muitas vezes a gente consegue, do factual, puxar algo interessante. Matéria sobre farmácia, por exemplo. Cinco assaltos a farmácias em um dia. Isso é estranho. Fomos buscar o que estava acontecendo, e quando fomos ver, existe uma tendência a assaltos a farmácias em Salvador. Fomos ver os motivos desse aumento, e vimos que os empresários não estavam interessados em investir em segurança, por que têm o seguro da mercadoria. Então é isso, ver a realidade, ver o que está acontecendo no dia, e tentar perceber se há a possibilidade de haver uma análise maior sobre o fato.

Então é verdade que as matérias mais “frias” saem normalmente nos sábados, domingos e feriados?
Sim. Qualquer jornal no mundo é assim. Vamos dar um exemplo: Dia de semana, muitas vezes é porque uma pauta caiu. Você tem esse artifício. Você está com uma tese no início da manhã e pode ser que no final da tarde não se confirme. Você tem que investigar, apurar, para isso que existe a apuração. Se no final da tarde você viu que aquele material não rendeu, ele não vale matéria. O jornal não vai sair com menos folhas por que você não tem matéria. Então você tem que ter um plano B.

Sempre tem um plano B, então? Como é? Você já deixa pronto?
Isso é trabalho mais dos editores, não é muito trabalho do repórter. A gente produz os materiais. A equipe tem que estar sempre com um bom número de repórteres, porque uns tem que tomar conta do dia, e um repórter ou dois fazendo matérias que não são do dia, que são de gaveta, mais trabalhadas.

Já teve algum dia que vocês planejaram as matérias de manhã e de noite mudou tudo?

Acontece sempre. Não é pouco comum.

A edição tem um horário certo pra fechar?
Geralmente fecha dez e meia da noite. Mas quando tem jogo, fecha mais tarde. Mas geralmente é às dez, dez e meia. Nosso horário aqui da redação depende da pauta, tem dia que você entra aqui de manhã e sai de noite, porque você começa a apurar coisas e a coisa vai se desenvolvendo durante o dia, e acaba que você faz hora extra. Tem dias que você consegue resolver no horário normal.

Como é processo de seleção das notícias no jornal? Você já recebe a pauta pronta? Você que faz os títulos? E as legendas?
A gente sugere título e legenda. Você já abre o programa de diagramação com a página desenhada e dá a sugestão do título e legenda que o editor vai acatar ou não. Quem fecha o texto e título são os editores, principalmente. A pauta fica aberta a sugestão dos repórteres, mas em geral a gente já chega com a pauta definida. No jornal Correio* tem o Mais*, que são matérias de maior tamanho porque não tem nenhum anúncio na página. Quem define essas matérias também são os editores.
Como funciona a rotina do Mais*? É diferente das outras partes do jornal, não é mesmo?
Então, o Mais* e o 24h são produzidos pela mesma equipe. Se uma coisa do dia que a gente pensava ser importante e depois da apuração percebeu que não é tanto assim, mas vale o registro, vai pro 24h. Uma notícia menor, um homicídio, uma notícia que você pode dar em um espaço pequeno, isso tudo vai pro 24h. Mas tudo depende do desenrolar da apuração. Tem notícia que você pensa que vai pro 24h, mas ao apurar percebe que tem uma história para contar. O jornal Correio* tenta se diferenciar da concorrência porque, além da notícia, tenta contar histórias. Ás vezes há uma história que parece ser besteira, mas rende, que comove as pessoas. O que vale muito pra gente é a história.

Existem casos das pautas caírem por falta de equipe, falta de estrutura para ir para o lugar e apurar?
É tudo por telefone hoje em dia. O A Tarde, por exemplo, tem uma equipe muito maior do que a gente; eles tem gente em Barreiras, em Vitória da Conquista, em Itabuna. Tem coisas que acontecem que não podemos ir para lá, então temos que resolver por telefone mesmo. Tem vezes em que o pessoal até pergunta: "Posso segurar repórter lá? Ele tava com uma matéria tão boa, até melhor que a da concorrência", mas é sorte, às vezes se consegue, as vezes não consegue apurar tão bem. Às vezes dá uma queda de pauta porque não conseguiu render matéria para o Mais*.

Falando de valores notícia, quais são as prioridades dessa seleção? Vocês tem algum critério de noticiabilidade definido?
O gancho conta muito. Como eu falei das farmácias. Você tem que ter o gancho factual, que ajuda muito a sustentar a matéria.

E se for um assunto como a greve, por exemplo? Que já tem muito tempo...
Isso é assunto que todo mundo quer saber o tempo todo, quer estar atualizado. Todo dia, se não tem alguma coisa muito grande, a gente bota no 24h, se tem alguma novidade que vale a pena ser discutida, vai pro Mais*. Essa é uma coisa que está sempre na agenda.

Estudamos que todas as notícias têm os critérios novidade, relevância, proximidade, por exemplo. Aqui no Correio*, algum assunto tem mais relevância que outro? No caso das mortes, por exemplo... 
É como eu falei, depende da história de morte. Um traficante chegou à festa e começou a atirar, por exemplo, e foi matéria de capa. Outro assunto polêmico foi o nosso colega aqui que viu o rapaz ser eletrocutado. Uma pessoa ser eletrocutada, em tese, não é uma notícia que valha tanto espaço, por que não foi por algum motivo de falta de segurança pública, foi uma fatalidade. Mas o fato do repórter ter presenciado e contado o drama como foi, fez o fato ganhar espaço, foi mais a história.

Então a forma como o jornalista conta a “história” também é importante, não é? Aqui no Correio* o que é mais importante, a forma como o jornalista conta ou o fato em si?
Os dois tem que andar juntos. Aqui no jornal tenho liberdade muito grande para ousar no texto. Não chega a ser jornalismo literário, mas posso "brincar" com o texto, não no sentido de deboche, mas saber trabalhá-lo. Nunca tive ninguém “podando” ou cortando meu texto. 

Você acha que os critérios de noticiabilidade mudam por causa dos públicos, ou eles acabam sendo os mesmos?
Mudam. Como eu falei, num jornal que tem leitores mais classe A e que tem um refinamento, por exemplo, pode se dar o direito de falar de economia, que tem muito mais técnicos rebuscados do que um jornal que se pretende mais popular. É diferente. A Folha de S. Paulo quando fala de política, fala para o político ler, mas também para quem gosta de ler política. E quando você faz isso em um jornal mais popular você tem que contextualizar diversas coisas que num jornal como a Folha de S. Paulo você não precisa, parte-se do pressuposto que as pessoas já têm essa bagagem, esse conteúdo para poder entender aquele contexto.

Por que o esporte é tão forte no Correio*? Toda segunda, por exemplo, a capa é sobre esporte.
Acho que em todo veículo é. É por que é um jornal mais popular, então tem esse apelo. O esporte é uma editoria que tem muito apelo, o povo lê, vende muito jornal.

Vocês têm um publico alvo definido?
Não sei. A gente tenta fazer matérias que as pessoas entendam, se encontrem na matéria. Matéria de economia, a gente não usa termos técnicos, é matéria de serviço. Como a pessoa vai financiar melhor o carro. É sempre tentando trazer o jornal para a realidade vida das pessoas, fugindo dos termos técnicos. Política não vai falar dos bastidores, não fazemos política para o político, fazemos para o leitor entender como está a situação da cidade, dos políticos. Enfim, é diferente do que o que a Folha de S. Paulo faz, por exemplo. É uma coisa mais feita para que o povo entenda, e não para o político ler. Tem muita coisa de economia nos jornais que parece que foi feito para economista ler, e a gente tenta aproximar mais do leitor.

Qual a classe social desse público?
Eu não gosto de pensar assim, eu não gosto de subestimar meu leitor. Eu odeio essa proposta do “leitor de 50 centavos”. Eu escrevo meu texto usando os termos que eu quiser usar.


Você lê as matérias dos jornais concorrentes? Você acha que o Correio* é concorrente direto do Massa! ou do A Tarde?
Eu leio. Leio mais o A Tarde. De fato, o maior concorrente, se você for olhar, é o A Tarde. Leio muitos blogs também. Internet é legal. São concorrentes bem francos e diretos, tem muita coisa legal nos sites. 
Eu acho que os 3 jornais tem perfis diferentes. O A Tarde é mais parecido com O Globo, é um jornal mais sisudo, mas não quer dizer que seja ruim, é muito bom em várias aspectos. O Massa! é mais popularzão, mais parecido com o Meia hora, do Rio. E o Correio* transita numa faixa que é um meio termo entre os dois. Eles não são concorrentes diretamente. Claro que são, por que estão todos no mesmo mercado dentro de Salvador, mas cada um tem um objetivo definido e diferente do outro.

Você concorda com a frase “o jornal ou o jornalista tem que dar o que o público quer”?
O que o público quer? Não fico ouvindo o pessoal na rua “e aí, você quer o quê?” não dá pra saber o que o público quer. Nós temos nossos critérios de noticiabilidade, como relevância, tudo aquilo, mas o que é que o público quer? A gente não faz pesquisas de opiniões mensais para mensurar se o público quer saber do quê. É mais o "feeling" mesmo.

A mudança do formato do jornal, o preço e o uso de linguagem mais informal tiveram como principal objetivo tornar o Correio* um jornal mais popular?
Não sei responder essa pergunta, mas deve ser, não é? Eu cheguei aqui em dezembro, e já tinha mudado, foi em 2008. Deu certo, né? Hoje o Correio* é líder no norte-nordeste. De fato, alguma coisa que fizeram deu certo.

Porque algumas capas de assinantes são diferentes das capas das bancas? O perfil deles é diferente?
Deve ser isso mesmo de atingir públicos diferentes. Eu imagino que seja. As capas mais “apelativas” vão mais pra rua do que as capas que são mais de serviço, que vão pro assinante.

Em sala foi discutida a diferença em interesse público e interesse do público. Como você vê essa diferença no jornal?
É aquela questão que você me perguntou mais cedo, né, se o que o público quer ver é prioridade... Eu acho que o interesse público é bem contemplado aqui no jornal. Eu fiz várias matérias que considero interesse público. E interesse do público... Eu acho que interesse do público não é aquele discurso de vestir a camisa da empresa. Nunca escrevi aqui nada que eu discordasse de ter escrito, nem que eu senti forçar a barra para poder vender jornal. Eu tive, por exemplo, há duas semanas, uma matéria que eu gostei muito de ter feito, e que o jornal investiu em mim uns quatro ou cinco dias dedicado só a essa pauta, sobre violência sexual contra adolescentes. É uma matéria de interesse público. É analítica, de interesse público, pegamos várias coisas (dados, etc), e qual foi o gancho factual que sustentou a matéria? Um boletim que a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República distribuiu à imprensa dizendo que a Bahia era líder em denúncia de abuso contra crianças e adolescentes. Isso motivou a fazer a matéria. É um exemplo do que eu estava falando mais cedo. Agora surgiu um novo dado sobre violência contra mulher. E aí uma colega minha falou que estávamos fazendo uma matéria parecida, mas fazendo uma análise de como funciona a violência contra a mulher aqui na Bahia.

Em poucas palavras, como você definiria a linha editorial do Correio*?
Como eu falei: Contar histórias. A viagem desse jornal é essa. Se você vier com uma boa história aqui para contar a editoria se empolga. O objetivo do jornal é esse. Se a história tiver um contexto maior, como se fosse o exemplo de uma situação, melhor ainda. É a questão da proximidade com o público.

Parece que o principal objetivo e “missão” do Correio* é fazer com que o público entenda e se sinta próximo das situações, não é?
É por aí.

Como você vê as linhas editoriais dos outros jornais?
O Tribuna trabalha mais com política, trabalhei no Tribuna da Bahia por três meses e eu diria que tem uma editoria política forte. E o A Tarde é um jornal que quer ser mais sério. O valor notícia é diferente do A Tarde para o Correio*. Acho que a gente puxa mais para a história, o que tem por trás, mas a linha editorial eu acho parecida. O Massa! é mais popular, então as notícias de polícia vendem mais pro Massa!, as capas têm mais esse apelo. Tentam fazer uma linha meio “debochada” das notícias policiais.

Por que às vezes há notícias que saem na capa, mas quando abrimos é só uma nota?
Foi uma coisa muito importante que aconteceu no final do dia, e não deu tempo. Sete horas da noite aconteceu alguma coisa que foi muito importante. Às vezes não há tempo pra escrever mais sobre algo que aconteceu às sete horas da noite. Mas temos que dar essa informação importante, que vale a capa.


Você acredita que existe uma instituição jornalística acima de todas as organizações?
Acho que os cérebros dos jornalistas funcionam meio que parecido, até porque a maioria circula pelos diversos jornais. A forma de saber analisar os fatos e adequar eles para saber se eles valem uma coisa ou outra são bem parecidas. E têm as práticas do jornalismo, a questão de como conduzir uma apuração é bem parecida. A prática é muito parecida em todos os veículos. Acho que essa instituição é mais a forma como os jornalistas se parecem no que eles fazem. Alguns mais competentes, outros mais criativos, mas em geral quem comanda tem uma visão meio parecida do que é notícia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário