Carlos Eduardo Brandão, Estela Marques e Renata Pizane
Priscila Melo, 28 anos, é formada em jornalismo pela FTC e atua há sete anos no Jornal Tribuna da Bahia. Começou como estagiária, já foi repórter e atualmente ocupa o cargo de editora do Caderno Cidades, tendo passagens por veículos como TVE , Band-Ba, Rede Record e ainda assessorou o governo de Paulo Souto por dois anos e meio. Em entrevista, ela contou um pouco do seu trabalho no jornal, rotina produtiva, linha editorial e comentou sobre o mercado jornalístico em Salvador.
Como é sua rotina?
Eu quando chego, a primeira coisa que faço é sentar, pegar todas as pautas do dia, inclusive as pautas que foram passadas por mim no dia anterior, e ver o que está acontecendo. Depois eu vou ler matéria por matéria, corrigir problemas em matérias - o que é normal, acontece com todas -, chamo e falo “sua matéria deveria começar assim, assado”. Faço o papel de chefia de reportagem, por exemplo, ligar pra uma equipe que está cobrindo um factual, derrubar a pauta, mandar ir pra outro local. Pego o mapa, vejo quantas pautas vou ter, quantas páginas vou ter, o que vai entrar aonde. E depois tem o fechamento, que a gente vai sentar e lidar com tudo isso: dar o título, dar o subtítulo, escolher foto, por a legenda... Tudo isso é trabalho do editor. O texto também, quando necessário, dou uma mexida.Qual seria a linha editorial da Tribuna?
A linha editorial da Tribuna, acho que é hoje a linha editorial do Correio e do A Tarde: ir atrás da notícia. Acho que a notícia passou, passa por transformações e isso vocês estudam na faculdade. Por exemplo, eu não sei se vocês se lembram, se já estavam na faculdade na época de Ricardo Noblat. Então, ele trouxe uma coisa maravilhosa que tinha em poucas matérias, que é humanizar a matéria. Como humanizar a matéria? Trazendo personagens como foco principal da matéria. Então assim, existe essas mudanças, porque antigamente não tinha muito isso. Claro, existia humanização da matéria, sim, mas muito nariz de cera. O que a notícia tem que fazer hoje? Se aprofundar mais na sua vida. Você quer saber o que acontece na cidade, mas você não quer SÓ saber o que acontece na cidade. Você quer saber o que afeta sua vida. Por isso que se você perceber, vou falar da Tribuna, já tem algum tempo que a Tribuna se readaptou pra dar sempre matéria de saúde, de comportamento, de tecnologia porque mexem com sua vida. Você tem que buscar um diferencial e um diferencial é uma matéria de comportamento. (...) A notícia muda, ela se readapta pra vida da gente. Existe uma mudança de comportamento e todo mundo precisa se readaptar, principalmente o jornalismo, que é o que passa a informação.
E seu concorrente direto?
Hoje? Todos os jornais são concorrentes. Se você for falar de lugar, o Correio em primeiro, o A Tarde em segundo e o Tribuna.
Qual é o público-alvo do Tribuna?
Público-alvo da Tribuna? O público-alvo da Tribuna é todos os públicos. Porque assim, se você pegar os leitores mais antigos da Tribuna, é um público do tipo A, ao mesmo tempo que é um público B, C, D. Tem uma coisa da linguagem, a linguagem é acessível pra todo mundo. Se você fala uma língua pra um só, você ta querendo atingir um público só. Não pode fazer isso.
Numa pesquisa recente, foi descoberto que o jornal é lido pelo público, em sua maioria, das classes A e B, não das C e D como estimado. Isso surpreendeu?
Por que pelo público A e B? Política. A Tribuna é muito lida por políticos, pelas secretarias. Muito, muito mesmo. Até surpreendeu um pouco a gente, porque se você pegar a linguagem da Tribuna, é uma coisa popular. Na verdade, o jornalismo inteligente é aquele que atinge a todas as classes.
Vocês mudaram a linha editorial, a seleção de notícias, impactou de alguma forma?
Isso não impactou diretamente, mas se há uma readaptação, há. As pessoas estão cansadas de ver matérias de violência, violência, violência... É tanta violência que você pega o jornal e dá de cara com violência e “ah, tenha dó!”.
Como você afirma que as pessoas estão cansadas de ver “violência, violência, violência” quando jornais populares que mostram muita “violência, violência, violência” vendem muito?
Olha, eu não vou falar pela empresa Tribuna da Bahia, mas particularmente. Eu vou para questão cultural e social. Isso é outra coisa, entendeu? A gente está num estado que estamos acostumados a ver música, informação, tudo assim: a gente dá o que o público gosta. O público gosta de ser educado, de ter educação. Então, infelizmente, nossos governantes não dão educação, entendeu? E o que há de pior de revista de fofoca, o que há de pior de jornalismo, o que há de pior de televisão, de jornal popularesco - não é popular, é popularesco, de forma pejorativa mesmo... Porque quando se fala popular, não significa que você está vendendo coisas ruins, porcarias, explorando o sentimento alheio. E quando a gente fala de popularesco, a gente fala de tudo isso que falei. É preciso ter inteligência pra acompanhar a mudança de comportamento da sociedade. Você quer ler o que afeta sua vida, saúde, o dia-a-dia, denúncias, ou você quer ler tipo “fulaninho que matava fulaninho”? Mas factual da cidade, que não explora o sofrimento do outro, pode ir pra capa. Vai, como o caso da menina que o carro morreu, acabou descendo a ladeira e atingido algumas pessoas na fila da clínica.
Por que o jornal tem duas editoras de Cidade?
Todo jornal tem funções separadas: chefia de reportagem, redator e editor. Na Tribuna, é 3 em 1. Por isso que a gente tem duas pessoas na chefia da editoria de Cidade. Aqui não tem redator e chefe de reportagem à tarde; eu e Carol (Carolina Parada …, também editora de Cidades) temos essa função. Aí, nos outros jornais tem a editoria de segurança, tem o editor de segurança, e aqui não tem editor de segurança. A gente que fecha segurança. Então, são muitas páginas, muitas tarefas pra duas, por isso que a gente divide isso. Eu assumo mais essa função de chefe de reportagem, por conta do horário, e ela fecha segurança.
A gente percebeu que o jornal tem o Caderno de Cidades e tem na primeira parte do jornal uma editoria de Cidade, na página 7. Como funciona?
A página 7, como por exemplo na matéria de hoje (26/06), não é de Cidades. É que mudou a bandeira, a bandeira era segurança.
Então o Cidades da página 7 é segurança...
É, é segurança. Agora, tem um detalhe: você ta falando da página 7 você ta fazendo um estudo do jornal de hoje. Geralmente, segurança vai pra página 14, 15, então vai depender do mapa; o mapa depende dos anúncios, dos cadernos do dia, da quantidade da página, e segurança não é página 7. Na realidade, ela é uma página preta e branca e a gente não pode colocar preto e branco nem na 8 nem na 9, que são páginas coloridas. A gente não vai botar bagaço de corpos numa página colorida. No caso das seguintes, é questão de diagramação.
Mas não é segurança, exatamente. Sobre o caso do estupro das gêmeas, próximo a Salvador, no dia 8 de junho, uma das gêmeas foi estuprada pelo pai, morreu e a matéria do enterro saiu com destaque na página 7, com a editoria de Cidade.
Não é que tenha saído na editoria de Cidade, mas veio com a bandeira de Cidade.
É isso, por isso que nos confundiu...
Se você olhar, eu não sei o A Tarde, mas o Correio não tem bandeira de segurança. É 24h. Cidade é 24h, está tudo junto. Tudo misturado, no mesmo pacote. É uma página com as notícias de polícia..
Qual critério justifica a localização de Política nas primeiras páginas?
Todos os jornais colocam política nas primeiras páginas. É política dos jornais, enfim. A Tribuna hoje, se você perceber, em questão de discussão de matéria e notícia de política, é mais forte que o Correio e o A Tarde. Então, não é porque tem que começar com política. O Tribuna sempre começou com política. Inclusive, quando você abre o jornal, a primeira página tem uma coluna forte, a Raio Laser. Coluna política tem sua força. É forte, é comentada no cenário político, ela está num local, digamos assim, de privilégio. Ela está num local privilegiado do jornal porque ela tem um contrato de leitor. Por ser uma parte do jornal mais... mais assim... “elitizada”, “intelectualizada”... é um público destinado, é a leitura que é forte.
Como fica a relação do portal do Tribuna com o impresso?
A redação é uma só. Quando acontece um factual, um está ligado ao outro. Por exemplo, hoje teve um caso de um criança que estava em casa e sem querer derrubou a vela, que incendiou a casa. Pra internet, tem lá o factual “sem querer uma criança blá blá”. Amanhã, a gente vai ter uma matéria mais produzida, falando dos riscos de acidentes domésticos com criança de férias em casa. De modo geral, o factual vai pro portal, no dia do acontecimento, e uma matérias mais produzida sai no impresso do dia seguinte.
O fato de o jornal não circular aos domingos interfere na rotina produtiva?
(risos) Desde que eu entrei, o Tribuna circula o final de semana. Acho que é por uma questão de anúncio; tem poucos anúncios no domingo e aí não justifica o gasto pra rodar, entendeu? Mas a redação trabalha sábado, normalmente.
Como foi, por exemplo, a cobertura sobre a greve dos professores estaduais?
Os jornais pararam um pouco de dar. Já são 75, 76 dias... O público vai ler? Seja sincera. Os professores entraram em greve. Os professores dizem que continuam em greve. Amanhã, numa nova assembleia, os professores decidem continuar a greve. Amanhã, eles dizem que o impasse continua. Você ta lendo essa matéria? Você vai ler essa matéria? Eu acabei de derrubar essa matéria - pronta, duas laudas. Teve a assembleia hoje e decidiram continuar a greve. Tem alguma novidade pro leitor? Nenhuma.
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